sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Uma revolta (ou uma glória) para o dia

Não quero dormir. Não quero parar para pensar. Não quero mais saber de dias ou de horas ou de fronteiras que não sejam as do meu café-cigarro-enternecido.

Nessas horas intermináveis em que me encontro, aonde acordar não é o começo de um novo dia e sim a continuidade do dia anterior, eu só quero parar, fugir, me esconder ou me entregar. Toda essa confusão, todo esse amor dentro rasgando a pele. Me aventurei no mundo prático. Caí de uma relação em outra, muitas marcadas pelo policiamento ético. Arrependi-me dos erros e temi toda e qualquer moral monogâmica tida nos gestos apaixonados, temi meu profundo hábito de masoquismo(quando sofremos conhecemos mais a nós mesmos?), acreditei no amor próprio e condenei a farsa do não-individualismo. Parecia um antídoto contra as perspectivas alienantes do meu vício passional da “entrega”. Na verdade, cansei dessas histórias em cima da minha cabeça. Escolhi o não-objeto, o nada, o vazio, a indiferença, o eterno desencontro.

Amor. Cansei dessas histórias, aonde, na verdade, são todos tão conservadores. Sim, tento aplicar minhas utopias no mundo, meu modelo de sociedade ideal. Quero ir além dos horizontes, transgredir esses modelos patriarcais de relacionamentos. As pessoas caminham em retrocesso e pensam que isso é modernidade. Essas dores sempre narcísicas, o maior drama que podem viver em meio ao amor é o ciúme. Atitudes tão moralistas mesmo em meio aos libertos.

Em verdade, me sinto errada e mundana. Ainda acredito que posso manter um amor vivo e apreciar os vôos da liberdade, sem que ter uma relação signifique um gesto de apropriação. Eu caio nesse vazio, sempre alimentando os vínculos. Há coisas que não quero perder, e por mais que todo pensamento me leve a acreditar em algo, vem o sentir e acaba com a minha razão. Devo fazer o que penso ou o que sinto?

Como insistente que sou, sempre quero encontrar novos métodos e estratégias de acreditar no amor. Vou continuar buscando novas táticas ou talvez se trate deste processo de reeducação onde confronto ainda as tradições do amatório.

Eu mal podia acreditar que ela chegasse por entre aquelas ruas, atravessasse a avenida, entrasse naquele local e emergisse de um grupo de pessoas anônimas. Por fora, estou calma, com aquela placidez oriental de atitude que é tão enganadora. Tempos em sua presença. Acho-a bem louca, no sentido de estar sujeita a incertezas e manias. Sua conversa seria reveladora, talvez, para um analista, mas eu não posso analisá-la. O que você constrói tão cuidadosamente? Um engrandecimento de sua personalidade, uma glorificação e fortificação do seu ser? No óbvio de minha admiração, ela se expande. Ela que discorda por puro prazer, me deixa curiosa ao tentar saber se diz o que quer dizer ou o que pensa realmente. Tão encantadora, tão bonita e tão incerta. Eu, que sempre precisei que me dissessem por qual caminho seguir, no sentido de não conseguir tomar grandes decisões, penso que deveria tentar ao menos uma vez e assim talvez conseguir segurar a sua mão. Mas o que dizer? Não consigo encontrar as palavras. Estou tão cheia de incertezas e confusões. O que podemos fazer? Abraço de imaginações.

Ela falou e mal pude compreender. Estava se revelando então? Fortemente confusa, mas isso também é uma revelação(meu coração disparou ao perceber que ela estava se mostrando para mim). Ela falava e então pedia desculpas por ter dito aquelas palavras, mas não entrávamos em uma conversa mais profunda (por não haver tal profundidade da parte dela?), porque há coisas que não se podem dizer. Ela conserva em si mesma a mais secreta por trás da conversa profunda. O medo de desagradar, de desapontar, creio que venha das duas partes. Eu aceitaria o risco de causar algum sofrimento posterior à ela? Ela sempre fora tão segura, sempre conseguira conversar tão bem, parece que as pessoas nunca a intimidavam. Como agora(justo agora) ela não sabia o que dizer?

Nos perdemos, mas algumas vezes revelamos o máximo quando somos menos como nós mesmas. Não quero que nada se apague. Não quero buscar lembranças que vão sendo levadas com o tempo. O que quero é: . Estou tentando não pensar mais. Não queria pensar quando estivesse com você. Nenhuma de nós consegue dizer a coisa certa. Seria medo? Estamos subjugadas. Vamos ficar subjugadas. Essa é a nossa realidade então.

Com tantas palavras em desordem e tantas definições ao se não-definir, não quero ficar com achismos. Espero que a manhã que irá chegar ao acordar, me faça ter um entendimento(ou a aceitação do não-entender) e se estenda até as horas da noite que serão manhãs ainda. Não há cansaço em meu corpo ou em minha mente, apenas uma remota inércia. Cansaço de descansar de coisas descansadas demais. É um excesso de energia tentando se passar por sonolência mas que no fim é apenas expectativa.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Carta de um amor perdido deixada sobre a escrivaninha

Diante de toda confusão vivida antes de você chegar – sim, parece que separei a vida em antes e depois de você, não que eu tenha deixado de ser eu, mas acrescentei tantas outras coisas que mudei bastante – eu acreditava que ninguém poderia se aproximar do meu mundo. Mas então, veio você. E tudo ficou mais bonito: as cores, os dias, as músicas, as letras. Eu não pensava poder haver felicidade maior, inútil pensar assim, bem sei, encontrar paz e alegria em outra pessoa que não em nós mesmos, mas encontrar isso em você, era uma forma de encontrar em mim também. De certa forma, eu passei a ser você. E eu nunca quis ser ninguém além de eu mesma. Meus conceitos sobre amar caíram por terra, porque eu não conseguia mais pensar estando ao seu lado. Tudo o que eu conseguia era sentir. Era como se um segredo fantástico existisse entre nós. E o que mais queria, era que você nunca fosse embora. O medo que me perseguiu durante meses acabou chegando ao ponto onde estou hoje. Ele me alcançou. E todas as vezes que você segurou minha mão, me puxando para longe dele, não foram o bastante. Ele se alojou entre eu e você. E por mais que tentássemos ignorar a presença dele, sabemos que tudo mudou. Você passou a ser você e eu passei a ser eu. E todas as brigas vieram, seja por motivos grandes ou pequenos, respirar diferente passou a ser ofensa. Agora, aqui estou. Com a casa me sufocando, porque você foi embora, mas tudo que aqui está, me lembra você e tem o seu cheiro. E quando você sai, de alguma maneira, eu espalho coisas minhas pelos cantos da casa e deixo meu perfume alojado em seu travesseiro, para que quando eu for embora, você também possa se lembrar de mim.



*P.s: escrito há três meses.

Cindy F.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Manhã

Levantou-se bem cedo. Faziam cinco e meia da manhã. Decidiu levantar-se cedo por querer ver as fases do dia amanhecendo de sua janela. Não, as grades atrapalharão sua visão. Irá além: calçará um tênis, vestirá um casaco e sairá para caminhar na pista do bosque. Assim poderá aspirar o perfume das plantas ainda molhadas pelo orvalho, ver as flores se abrirem com o dia.

A manhã está calma e silenciosa. É possível até escutar o canto dos pássaros que mais parece uma conversa. O sol luta com as nuvens para conseguir aparecer. Os níveis diferentes de claridade mudam a cada hora.

Depois de caminhar um pouco, senta-se. Tira o casaco. Quer que a luz do sol a cubra por inteiro, quer receber a natureza em seu corpo. Assim, ficará perfumada por esse cheiro levemente sufocante e bom de húmus, esse cheiro de terra perfumada por milhões de folhas e flores esmagadas.

Ela continua parada, sentada, olhando olhando olhando. Ninguém aparece. Um gato passa correndo entre as árvores. Ela está sozinha. Está sozinha e livre. Com toda essa liberdade que ela não sabe usar e que chega a sufocá-la.

O sol se abre mais. A árvore faísca de sol nas folhas. Há uma leve brisa que bagunça os seus cabelos. Mas por quê esse romantismo: que bagunça os seus cabelos? A verdade é essa. Só sei mesmo é sentir.


Cindy F.